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  • 03/01/2018

    O que é necessário para se tornar um grande músico?

     

    Se realmente encontrássemos a resposta, os cientistas iriam trabalhar duro em um laboratório, tentando criar clones do violinista itzhak Perlman, do flautista Jean Pierre Rampal, dos pianistas Claudio Arrau, Nelson Freire, do tenor Pavarotti, entre outros.

    Menciono esses nomes de improviso porque tem sido um privilégio meu ter tocado no Rio de Janeiro com todos esses maravilhosos criadores de música (exceto Perlman) e muitos outros.

    Quanto a Perlman, ainda me lembro de uma cena na cidade de Nova York quando eu estava tocando como um jovem oboísta na orquestra jovem da Associação da Orquestra Nacional. Esperando pelo elevador, encontrei um adolescente sorridente, que veio vindo de muletas. Quando entramos no elevador, perguntei a ele - não sei por que - "você sabe quem é o solista que vai tocar essa semana com a gente no Carnegie Hall?"
    "Eu sou seu solista", disse para minha surpresa o adolescente: Itzhak Perlman. E, de fato, ele foi brilhante, interpretando um Concerto de Violino de Sibelius com grande emoção. Não importa que ele tenha que ficar sentado para se apresentar: o talento musical não é uma dádiva apenas para os fisicamente perfeitos.

    Nossos caminhos se cruzaram de novo anos mais tarde em Tel Aviv quando ele e outro grande violinista, Pinchas Zuckerman, foram não só solistas, mas tocaram juntos na ultima estante dos violinos na Primeira Sinfonia de Mahler, com a direção de Zubin Mehta e esse colunista tocando corne-ingles.

     Ver as notas escritas em uma partitura é uma coisa, mas tocá-las é bem diferente. Minha inspiração para essas observações é uma gravação que ouvi hoje em Radio Mec, com Arthur Rubinstein tocando o Concerto nº 2 de Rachmaninoff, com a Sinfônica de Chicago sob a lendária regência de Fritz Reiner.
    Tive o prazer de tocar o mesmo concerto como primeiro oboísta da Orquestra Sinfonica Brasileira com Nelson Freire, Arthur Moreira Lima, Arnaldo Cohen e outros como solistas. Mas Rubinstein - um fã de Villa Lobos e vice-versa - é Rubinstein, e há algo em sua interpretação que me toca profundamente.

     E eu posso dizer o mesmo de outros com quem tive a sorte de cruzar caminhos durante concertos com a Orquestra Sinfônica Brasileira: a pianista Ingrid Haebler, Martha Argervitch, o violinista Salvatore Accardo, o violoncelista Rostropovitch, os tenores Placido Domingo, José Carreras, e o cravista (especialista em Bach) Karl Richter, entre outros.

      Para a geração mais nova, alimentada por rap e rock n' roll "clássico", os nomes acima provavelmente não significam nada. Mas para esse observador, eles são todos uma lembrança carinhosa e, por isso, nunca deixei o Rio de Janeiro.

     E, localmente, há tantos talentos em todos os instrumentos - que nunca participaram da Juilliard School of Music - que hesito em citar seus nomes aqui por medo de deixar alguém de fora. Esses nomes incluem meu antigo maestro por vinte anos na Orquestra Sinfônica Brasileira, Isaac Karabtchevsky; minha ex-maestrina na Orquestra Sinfonica Nacional -Uff, Ligia Amadio; os pianistas Jacques Klein, Fernanda Canaud, o fagotista Noel Devos, o flautista e maestro Norton Morozowicz e os clarinetistas Jose Botelho e o jovem Walter Jr.Silva Vieira, em Minas Gerais; o violinista Daniel Guedes; e o celista David Chew. (por favor, me perdoem os outros grandes músicos por omitir seus nomes)

    Na foto à esquerda, Harold Emert com o violinista Jerzy Milewski (direita) e sua esposa Aleida Schqeitzer-Milewski. Na foto à direita, Emert com o tenor Placido Domingo (centro) e o violoncelista britânico David Chew (esquerda)

      Mas devo confessar que mesmo depois de décadas tocando no Brasil, ainda fico perplexo como o músico brasileiro típico consegue progredir tanto sem seguir o estudo tradicional e o treinamento sistemático a que estamos acostumados no Velho Mundo.

      E existem grandes talentos nessa nação vasta e musical. Eles incluem um dos maiores oboistas do país hoje, Alex Klein, que quando era adolescente foi meu aluno em Curitiba há quatro décadas, quando cheguei ao Brasil.

      Tornar-se um grande músico, ou simplesmente um bom músico, requer não só talento, mas dedicação, o aprendizado correto e, infelizmente, o dinheiro para ter um bom instrumento, professores, escolas de música, e depois que se tornar um artista consumado, terá que ter dinheiro para divulgação, roupas e viagem, porque nem todos os convites que você receber para tocar serão com todas as despesas pagas.

       Digo por experiência pessoal, porque há anos atrás, quando eu pude pagar minha viagem de 12 a 24 prestações, aceitei convites para realizar recitais longe do Carnegie Hall, incluindo Brunei, Taití, Haiti, Austrália, Nova Zelândia e toda a América Latina.

      Parece romântico e aventureiro, mas antes desta era do terrorismo islâmico, me apresentei na Guatemala durante um golpe de estado, fiquei próximo a uma manifestação tumultuada perto do hotel em Seul, Coréia do Sul, onde eu estava hospedado, peguei um táxi que mal escapou da perseguição de uma multidão descontrolada lançando pedras na Índia, e por último, mas não menos importante, no reino de Brunei tive que suportar a mãe coruja do meu acompanhante, um jovem pianista, cuja mãe insistia que o filho tinha que estudar na Julliard de Nova York e em nenhum outro lugar.

         Em referência a ser um músico de orquestra, o meu maior conselho para qualquer instrumentista que deseje se juntar a uma orquestra famosa é: fique com a boca fechada quando você não está tocando. Só abra para respirar.

     

    Na foto à esquerda, Harold Emert com o flautista Altamiro Carrilho (direita), em uma apresentação na Casa do Choro, no Rio de Janeiro. Na foto à direita, Emert e orquestra sendo regidos por Jean Pierre Rampal.

        Enquanto fui instrumentista de corne-inglês solo na Filarmônica de Israel durante uma turnê dos Festivais Europeus, com Zubin Mehta dirigindo a Symphonie Fantastique de Berlioz, tive a audácia de entrar no vestiário do famoso maestro antes do nosso concerto na Suíça, e educadamente pedi-lhe para sorrir - em vez de permanecer com um rosto carrancudo - quando eu tocasse o famoso solo de corne-inglês no terceiro movimento (Cena no Campo).

         O maestro Mehta de fato seguiu minha dica, sorriu para mim durante meu solo, mas eu, subsequentemente, acabei por não ficar na Filarmônica de Israel, mas preferi partir para o que viria a ser uma colorida carreira musical no Rio de Janeiro.

    Texto: Harold Emert (contato) - tradução: Roberto Carelli

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